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sábado, 7 de setembro de 2013

O TREM PARA JAPERI

"Há um eterno ir e vir, despedidas e um quase sempre nunca encontrar."
Franz Kafka
A vida é uma  longa Estação estreita. Idas e vindas, encontros, conflitos e muitos desencontros. Estão todos na Estação. Enquanto há vida, há Estação. Muita maledicência, muitos mal entendidos e algum bom senso. O problema e o pior é na hora de pegar o trem. Que trem pegar? Para onde vai o trem?
Os trens da vida são cronológicos. Na época boa, na minha época, aos vinte e poucos anos era quase obrigatório pegar o trem para Japeri. Era um frenesi na Estação, um alarido ensurdecedor para pegar o trem de Japeri. As malas se amontoavam pelos cantos. Muitos beijos na boca e profusas carícias. Só não havia crianças para aperfeiçoar o burburinho.
Japeri era práticamente um Shangri La. Tudo era lindo em Japeri. Tudo era bom e transformador em Japeri. Japeri era uma tentação irresistível sobretudo porque todos iam para Japeri. Nessa ocasião, apesar da pressão social e da publicidade massiva e torturante fiquei na Estação. Nunca gostei de multidões alucinadas. Para ficar na Estação, era preciso muita coragem.
Resisti bravamente aos encantos de Japeri. Era um promessa de felicidade na qual nunca acreditei. Sou incrédulo por convicção. Foi duro ficar anos e anos na Estação. Passavam muitos trens para Japeri. Mas Japeri definitivamente não era o meu destino. Vaguei décadas como um espectro na Estação. Ninguém entendia a minha renitência. Era terrívelmente adjetivado. Chamavam-me de maluco, de esquisito, de pirado, etc. 
Passavam muitos trens, mas todos para Japeri. Era penoso viver na Estação. Contentava-me em conversar com alguns Anti-Japerianos que dormitavam nos bancos e povoavam a Estação. A maioria estava em Japeri. Nós, os da Estação, tinhamos um certo desprezo pelos festivos e delirantes moradores de Japeri.
Esperei pelo MEU TREM anos a fio e ele não chegava. Lá pelas tantas, começaram a chegar os Dissidentes de Japeri dizendo que Japeri não era  nada daquilo que propalavam. Os dissidentes eram o conforto da minha escolha. Os que ficaram em Japeri, só ficaram porque primavam por salvar as aparências. Os dissidentes vinham carregados de filhos e decepções. Os casais já não se amavam tanto. Era um pessoal angustiado e muito mal humorado. Muitos edílios foram desfeitos. Aos poucos a Estação foi ficando cheia de gente. Eram os infelizes dissidentes de Japeri.
E eu continuei na Estação.

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