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sábado, 7 de setembro de 2013

A PARÁBOLA DA AVENIDA BRASIL

Chovia torrencialmente no Rio de Janeiro. Rios caudalosos se formaram em cerca uma hora. Ônibus cheios de pobres atravessavam os rios fazendo ondas e humilhando os carros de passeio. Estou usando a palavra ônibus porque sou muito bonzinho. Na realidade, a cidade do Rio de Janeiro nunca teve um só  ônibus; são todos Caminhões para pobres tratados como carga. Eta cidade maravilhosa!
E é neste dilúvio vespertino que encontramos o nosso querido Aristides Kelson de Souza. Andava devagar no seu Gol Caixinha um ponto oito que um dia já tinha sido vermelho. Agora ostentava uma cor indefinida. Era um carro pintado pelo sol e a chuva que o castigaram durante décadas. Isso para não falar dos riscos feitos pelos vândalos filhos da puta. A chuva não cedia e ele tinha que chegar a Bonsucesso.
Na Avenida Brasil onde transitava, muitos carros já tinham pifado. Que chatice! O seu Golzinho resistia bravamente.
A visibilidade era quase nula em alguns momentos. E foi num desses momentos que Aristides se viu completamente perdido em meio ao temporal. Tinha errado uma "agulha". Andava, andava e não sabia mais onde estava. Prestava atenção no volante e ao mesmo tempo procura uma placa ou alguém que o ajudasse a saír daquele pandemônio.
Aristides quando ficava nervoso passava a mão várias vezes no cabelo como se o tirasse a testa. E a chuva não parava. Sentiu que do lado do carona havia água no assoalho. Reconheceu que aquele carro que tanto adorava estava mesmo ficando podre.
Súbitamente surgiu da penumbra um senhor de terno bege ou branco. Aristides ia muito devagar. O homem se dirigiu a ele e lhe perguntou:
- O senhor está perdido?
- Estou completamente perdido. Não sei mais onde estou.-respondeu
- Mas para onde vai?
- Eu estava indo para casa em Bonsucesso.
- Então, pegue a primeira à direita, faça o contorno, suba o viaduto e depois é sempre em frente.
- Muito obrigado. O senhor salvou a minha vida.
- Boa sorte.
Aristides cumpriu à risca o que o homem misterioso lhe tinha dito. Depois de muito andar, notou que a chuva tinha abrandado. Entretanto não reconhecia o lugar em que estava. Que lugar era aquele? Ali não era Bonsucesso.
Do nada, apareceu-lhe o homem misterioso da Avenida Brasil que exclamou satisfeito:
- Viu?! Conseguiu chegar em segurança. A chuva já parou e o senhor está salvo.
- Mas..... este lugar não é Bonsucesso. Que lugar é este?
- Que importância tem isso? Todos os lugares são iguais.
- O senhor vai me desculpar, mas eu não moro aqui. Não conheço este lugar.
- Prefere voltar para a Avenida Brasil? Aqui é bem melhor. Ou não é?
- É, né! Mas como se chama este lugar.
- Aqui é o famoso bairro de Cordovil.
- Cordovil? Mas eu moro em Bonsucesso.
- E daí? Você saiu do temporal e está a salvo. Isso é que interessa. Aqui você vai conhecer muita gente boa. Você vai ser amado pelo pessoal. Aqui é o seu lugar. Nunca mais você vai se perder. Esteja certo.
- É.....Legal!
- Ah, já ia me esquecendo. O senhor pode ficar aqui à vontade. Sinta-se em casa. Cobramos apenas dez por cento do seu salário. Apenas isso.
- Dez por cento? Do meu salário?

Hoje Aristides Kelson paga para achar que se achou. Afinal qualquer coisa é muito melhor que a consciência e o sofrimento da perdição.

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